Como otimizar um texto científico em três passos

Investigadores clínicos e de outras áreas da ciência são frequentemente chamados a redigir documentos científicos, que podem ir de simples comunicações (a submeter a eventos científicos) até artigos para publicação em revista com revisão por pares.

Conforme abordado num texto anterior (Autoria, medical writing e ghost writing: o seu a seu dono), o processo de escrita é exigente e por vezes complexo. Para além disso, a competitividade do meio torna esta atividade desgastante e por vezes desmotivante.

Há, no entanto, estratégias simples que podem, de forma rápida, melhorar a qualidade e legibilidade de um documento científico, aumentando a possibilidade de retorno positivo relativamente ao mesmo.

Se ainda não reuniu condições para contratar um medical writer profissional ou optou por investir em (auto-)formação nesta área, este artigo pode ajudá-lo a olhar para os seus textos de forma crítica e a fazer pequenas mudanças estruturais com alto impacto na qualidade do texto em questão. Antes de avançar e considerando que, de um modo geral, a escrita científica se processa em inglês, sugiro a aquisição de uma gramática da língua inglesa que servirá como material de apoio e consulta em caso de dúvida, mas também como ferramenta de formação contínua.

 

  1. Defina a mensagem principal e o público-alvo

Esta estratégia é essencial se o objetivo de quem escreve é transmitir uma mensagem clara e objetiva a um público específico, como é o caso dos textos científicos.

Relativamente à mensagem, poderá fazer-se uma decomposição em mensagem principal e algumas mensagens secundárias. A mensagem principal deverá ser o fio condutor de todo o documento e deve manter-se presente ao longo de todo o processo de escrita. Uma boa estratégia é escrever a mensagem principal simples e objetiva num post-it (de papel e eletrónico) de forma a fomentar a sua leitura frequente. Assim, nunca nos distanciamos da ideia que queremos transmitir e o texto irá certamente refletir a mensagem principal definida. As mensagens secundárias poderão ser inseridas, com menos enfâse, em secções específicas do texto (resultados, discussão ou conclusões).

Se definir a mensagem a transmitir é importante para selecionar que parte dos resultados deve ser destacada, definir e conhecer o recetor da mensagem é fundamental para o processo de escrita. De facto, o documento deve ser estruturado e escrito considerando as características do público ao qual se destina, sendo que todos os detalhes devem ser adaptados de forma a que a mensagem principal e as secundárias cheguem ao destinatário de forma clara e objetiva. Imagens, tabelas, fluxogramas e listas podem ser previamente definidos e adaptados de forma a facilitar a transmissão da mensagem a públicos específicos. Assim, recomenda-se que, antes de iniciar a escrita, seja feita uma pesquisa acerca do público-alvo incluindo área de formação, profissão ou área de atividade, idade e outras características específicas que possam condicionar a transmissão de informação.

 

  1. Corte tudo o que é acessório

Considerando que a comunicação científica deve ser clara e objetiva sem deixar margem para interpretações variadas, torna-se essencial retirar da construção frásica todos os elementos gramaticais que não acrescentam conteúdo. Um bom exemplo são os advérbios que continuam a ser explorados como forma de “embelezar” textos científicos sem acrescentarem informação e, muitas vezes, acrescentando dúvidas. De uma forma geral, a construção frásica de um texto científico deve ser simples, sem recurso a artefactos linguísticos e jargão.

Neste processo, a estrutura do documento merece também ser previamente definida através da divisão em seções que facilitem a leitura e a pesquisa.

Numa primeira fase, e de forma a garantir que o documento inclui toda a informação relevante, o processo de escrita pode ser livre e seguir a intenção base de não omitir nenhum detalhe. Quando assim é, numa fase seguinte, o texto necessita de um processo de revisão durante o qual se verifica que as mensagens a transmitir estão patentes nas secções apropriadas, se otimiza a construção frásica e se removem todas as secções, expressões e/ou palavras que não acrescentam informação relevante.

Este processo pode ser “doloroso”, mas é essencial para a criação de documentos rigorosos, claros e objetivos.

 

  1. Use a regra do paralelismo em frases e listas

Uma das incongruências mais comuns em textos científicos é a ausência de paralelismo em frases longas/complexas (ligadas pelas conjunções “e”, “ou” ou “mas”) ou em listas (por tópicos).

A regra do paralelismo em frases indica que a construção frásica das secções da frase, ligadas pelas conjunções indicadas, deve ser similar. Ou seja, em ambas as secções o posicionamento do sujeito e predicado deve ser igual e o tempo verbal devem ser o mesmo. A frase seguinte serve como exemplo:

“Our objective was to increase efficacy and improving safety.”

Neste caso, na primeira secção da frase o verbo está no imperativo e na segunda secção está no gerúndio, criando uma quebra no fluxo da leitura.

No caso das listas, recomenda-se que todos os tópicos sigam uma construção frásica similar, como se pode observar na seguinte lista:

 Subjects will be excluded from the study if they:

  • Are older than 45 years of age
  • Have type 2 diabetes
  • Weigh more than 90 Kg
  • Show signs of metabolic syndrome

 

Nesta lista, todos os tópicos começam pelo verbo no presente do indicativo criando uma continuidade na leitura que facilita a compreensão do conteúdo.

Na fase final do processo, pode ser útil dar a versão final do texto a ler a uma pessoa que se aproxime, em termos de características, do público-alvo para validar a transmissão efetiva das mensagens definidas e a um medical writer ou a alguém com experiência em escrita para detetar gralhas e falhas gramaticais. Não existindo esta possibilidade, a melhor estratégia é regressar ao texto alguns dias depois de estar finalizado. Este distanciamento permitirá detetar falhas e encontrar soluções para frases ou secções mais complexas.

O texto científico só tem a ganhar se apostarmos na simplicidade, sem descurar o rigor científico. Assim sendo, simplifiquemos!

Se considera esta temática relevante e quer alargar a sua discussão, deixe os seus comentários em baixo ou contacte-me.

Até breve!

Paula

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Paula Pinto

Paula Pinto

Medical Writer e Consultora licenciada e doutorada em Ciências Farmacêuticas pela Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto.

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